GRÃO

Se isso, então aquilo, ou não. Se existem momentos de felicidade plena, se é possível flutuar, reter um sorriso longo (que dure alguns segundos), como se prendêssemos o ar, e aquele sentimento permanecesse suspenso... Andar pela cidade de corpo dado, olhar o contorno dos prédios e dos elevados. Os desenhos. Grafite. Cor. Se for possível jogar fliperama. Se numa tarde de chuva, cinema. A 140 por hora, o som no Maximo. Chupar a casca de uma manga, lambuzando a cara. Se um mergulho. Cheiro de café passado. Se cachorros e pôr-do-sol. Os prédios e as luzes de uma vista noturna. À noite, a pista e as luzes, todos dançando, muito próximos, como se numa lufada, e o som no Maximo. Se os bicos dos seios duros e empinados na blusa. Se o quente passa úmido pras mãos entre pernas. Se uma bebida, se um cigarro, se um trago também longo. Se uma trepada suada e suja. Se tudo isso pode acontecer, então o estado de felicidade absoluta e infinita é possível. Se esse momento existe, então é estritamente lógico que ele possa ser vivenciado agora e sempre. Perpetuado. Da mesma forma, se por um instante experimentarmos a dor, um frio de lamina, se uma despedida, se um choro compulsivo, a noticia de um câncer, se o nosso bar preferido fechar... As rupturas amorosas. Se o sentimento de guerra, a tensão da bala, a sirene da policia, se o ódio dissimulado nos olhos do outro, então perfeitamente possível viver a dor absoluta, inabalável, dilaceradora e quieta, sempre e para sempre. A laceração de um sangramento. A permanência de um beijo. A eternidade de um gol. O fim do jogo. O sonho da menina... Vagam na ampulheta.


Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...